"TODA SOCIEDADE SE AFERRA A UM MITO E VIVE POR ÊLE. O NOSSO MITO É O DO CRESCIMENTO ECONÔMICO"- Tim Jackson

sexta-feira, 4 de março de 2011

GEOPOLÍTICA

Uma guerra na Europa?

PAULO PEREIRA DE ALMEIDA, PROFESSOR UNIVERSITÁRIO

Uma análise à situação geopolítica actual só pode deixar-nos - uma vez mais - preocupados com a situação financeira da Europa, em particular com a situação da União Europeia (UE). Vejamos - portanto - três fenómenos que podem, eventualmente, ajudar-nos a compreender um pouco melhor uma parte do contexto da crise mundial actual. E - esperemos - a evitar a repetição de erros passados.Primeiro, as consequências para o sistema financeiro mundial de uma economia excessivamente especulativa que se auto-alimentou nos últimos seis anos, sem que existisse uma regulação ou fiscalização das actividades dos seus principais actores (bancos, sociedades de capitais bolsistas, e empresas governamentais). Destas consequências ressalvo aqui duas: um aumento dos níveis de insegurança no emprego e um nível mais elevado das ameaças de eclosão de conflitos sociais. As actuais revoltas populares no Egipto, Líbia e em outros principados árabes são, recordemos, o resultado de uma ausência de expectativas de uma geração que está, há muito, sem emprego ou que é paga abaixo daquilo que designamos como um nível tolerável de capital social, económico e cultural. Mas - entenda-se - também algumas das gerações de jovens europeus se encontram em idêntica situação: os movimentos migratórios e a fuga de cérebros para os países asiáticos dos jovens mediterrânicos encontra-se já identificada. É uma tendência. Preocupante.Em segundo, as consequências para a classe média dos fluxos de capitais dos Estados membros mais ricos para os mais pobres da UE, cujo financiamento indirecto da banca nacional via os bancos centrais assumiu proporções que colocaram o sistema de trocas à beira do colapso. Ou seja, impossibilitados de captar recursos por via dos mercados abertos e globalizados, os diversos Estados europeus, procurando entretanto assegurar um nível razoável de segurança finan- ceira, recorreram a um aumento da carga fiscal. Com sistemas de cobrança fiscal ineficientes e com sociedades atomizadas e - portanto - longe da noção de bem comum, tem sido a classe média e dos assalariados a que mais tem sido chamada a contribuir. E com - como é sabido - consequências para o seu empobrecimento e diminuição de níveis de segurança percebida, quer no emprego, quer no período de saída do mercado de trabalho. Num cenário de tensão sobre os sistemas de Segurança Social, e de pagamento dos valores das pensões de reforma, assiste-se - assim - a uma erosão na visão de um futuro estável. Uma outra tendência. Preocupante, pois diminui os níveis de afecção social e gera grandes frustrações.Em terceiro, e por último, as consequências de uma sociedade demograficamente alterada, quer nos seus indicadores de manutenção geracional quer na composição dos seus agregados familiares. Ora este fenómeno introduz uma nova pressão sobre os Estados, os Governos, os mercados, e - naturalmente - as suas lideranças. Espera-se, por tudo isto, que um aparente objectivo unívoco de criação de uma união monetária (por via do euro) não potencie a eclosão de um conflito mais grave. Numa análise fria há hoje - em meu entender - sinais preocupantes de retorno ao período entre as duas Grandes Guerras.

FONTE:DN-LISBOA 04/03/2011

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